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O uso de meios alternativos para a quitação de tributos – O caso dos Precatórios Requisitórios e outros créditos

É recorrente consultas a respeito deste tema. As mais comuns envolvem precatórios requisitórios[1] cedidos por terceiros, mas já houve pedidos acerca de pedras preciosas, títulos da dívida agrária, apólices da dívida pública, mas a análise, aqui, se restringirá aos créditos judiciais. Para tanto, o texto constitucional de 1988 estabelece as regras fundamentais:

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.
11. É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei do ente federativo devedor com auto aplicabilidade para a União, a oferta de créditos líquidos e certos que originalmente lhe são próprios ou adquiridos de terceiros reconhecidos pelo ente federativo ou por decisão judicial transitada em julgado para: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021) Vide ADI 7047 e ADI 7064 (o STF julgou inconstitucional a parte tachada)
I- quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa do ente federativo devedor, inclusive em transação resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com a administração autárquica e fundacional do mesmo ente (Incluído pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021)

Como se vê, o caput do art. 100 principia por se referir a precatórios, mas no § 11º refere-se, também, a créditos não vinculados a precatórios que já estejam reconhecidos pelo Judiciário ou pela autoridade administrativa (fase anterior ao pedido de expedição de Precatório). Deste modo, seja quanto a precatórios, seja para créditos judiciais transitados em julgado, é indispensável que exista lei expressa que autorize o seu uso. Isto se dá porque a regra é o pagamento de tributos em moeda corrente, conforme artigo 162 do Código Tributário Nacional – CTN, o que produz o efeito de extinguir o crédito tributário decorrente, nos termos do art. 156, do mesmo CTN (este mesmo artigo contém outra previsão de extinção do crédito tributário: a compensação). Até aqui já se afasta qualquer possibilidade de uso de precatórios para quitar débitos futuros.

Perante a RFB e PGFN[2], precatórios próprios ou de terceiros têm sido admitidos para fins de quitação de tributos vencidos, sendo exemplos as legislações dos variados programas Refis[3] e da recente regulamentação da Transação Tributária[4].

E as compensações com habilitação de crédito para pagar tributos futuros? Estas realmente existem, mas não para os precatórios, mas para os créditos reconhecidos judicialmente, os quais, pelo artigo 74 da Lei 9430/1996, no caso da RFB, comportam compensação para quitar tributos vencidos e vincendos, hipótese em que o contribuinte pode dar início ao procedimento mediante o cumprimento das regras indicadas na Instrução Normativa RFB nº 2055/2021 (dispõe sobre restituição, compensação, ressarcimento e reembolso na RFB). Nesta IN atente-se para o art. 101, par. único, que veda a compensação de créditos já executados perante o Poder Judiciário, com ou sem a emissão de precatório (ou se compensa ou se pede o precatório – o uso conjunto é vedado).

E o fato de habilitar o crédito traz segurança? De modo algum. Se é proibido compensar com precatórios, próprios ou de terceiros, a habilitação validade alguma terá. Esta habilitação é um ato meramente formal, consistente no preenchimento de um formulário ou (…)Pedido de Habilitação de Crédito Decorrente de Decisão Judicial Transitada em Julgado, constante do Anexo V, conforme redação do art. 102, § 1º, I da citada IN, que deve ser instruído com certidão do inteiro teor do processo e outros documentos indicados nos incisos II a VII do mesmo artigo. Trata-se de um ato prévio, indispensável, preparatório para a compensação que não reconhece direito algum. O art. 103 reconhece isto ao atribuir a um Auditor Fiscal deferir a habilitação quando os requisitos formais do art. 102 estiverem cumpridos e, o art. 104, expressamente indica que O deferimento do pedido de habilitação do crédito não implica reconhecimento do direito creditório nem homologação da compensação.[5]

E quando haverá o reconhecimento do direito de crédito ou da compensação efetuada? Apenas quando a autoridade expressamente reconhecer tal condição (homologação expressa). A homologação por decurso de prazo (homologação tácita[6]), extingue o crédito, mas não o reconhece formalmente. Ambas as situações se dão no prazo de 5 anos. Trata-se de combinação dos artigos 65 e 73, § 2º da IN 2055/2021 com os artigos 150, § 4º, 156, II e/ou 173, estes do CTN.

Os procedimentos de compensação nos Estados e Municípios obedecem aos procedimentos das respectivas legislações.

Para auxiliar na compreensão e extensão do problema que isto pode causar, seguem sites para fins de leitura complementar:

– 1/Jun/2021: Receita alerta para irregularidade no uso de créditos de terceiros

– 01/11/2022: Receita Federal alerta para publicidade fraudulenta oferecendo possibilidade de compensação mediante compra de créditos de terceiros — Receita Federal (www.gov.br)

– 03/11/2022: Receita Federal desarticula organização que simulava quitação de tributos federais

– 05/01/2024: PGFN divulga propostas de negociação com benefícios — Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (www.gov.br)

– 22/02/2024: Uso de precatórios de terceiros para pagamento de tributos federais na transação tributária – Jus.com.br | Jus Navigandi

– 18/03/2024: Solução de Consulta 27 – Cosit;

– Acesso em 19/04/2024: Habilitar crédito tributário federal decorrente de decisão judicial transitada em julgado (www.gov.br)

– 22/04/2024: Solução de Consulta 98 – Cosit.

 

[1] Conforme o Conselho da Justiça Federal, “Precatório é uma requisição de pagamento expedida pela Justiça para determinar que um órgão ou entidade pública pague determinada dívida, resultante de uma ação judicial para qual não cabe mais recurso (trânsito em julgado). Nessa mesma definição se enquadra a requisição de pequeno valor (RPV).”
[2] Portaria PGFN 10826/2022;
[3] Lei 9964/2000, art. 2º, § 7º, I.
[4] Lei nº 13.988/2020, art. 11, V.
[5] A compensação indevida pode implicar na lavratura de Autos de Infração com multas majoradas entre 150% e 225% do total apurado (art. 74, §§ 1º e 2º da IN 2055/2021), afora a formalização de processo de Representação Fiscal para Fins Penais ao Ministério Público Federal para a apuração dos crimes de estelionato e sonegação fiscal.
[6] O fato de a RFB deixar transcorrer o prazo de 05 anos sem que qualquer procedimento de análise ou glosa tenha sido instaurado não serve como demonstração de idoneidade desses créditos ou, ainda, de que a RFB os tenha admitido, alerta-se.

 

🎥 Prefere conteúdo em vídeo? Recomendamos assistir o episódio 50 do nosso Momento Consult, em nosso canal no YouTube, que trata sobre PRECATÓRIOS E SEU USO PARA COMPENSAÇÃO DE TRIBUTOS.


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